segunda-feira, 5 de março de 2018

Sinto muito

Eu sinto muito.
Sinto sua partida. 
Sinto cada ato.
Sinto a incapacidade da entrega 
e os nossos fingimentos de que está tudo certo 
quando não está.
Sinto muito que a prática seja diferente da teoria e das palavras confortantes que dizemos um ao outro.
Sinto nosso medo e nosso desejo.
Sinto muito o sentido sem sentido 
que nos envolve quando não nos olhamos por dentro.
Sinto muito por ter sentido raiva
quando não me senti amada. 
Sinto muito por ter sido vingativa
quando o que queria
era você 
de mãos dadas comigo
e a gente beijando no metrô.
Sinto a rejeição disfarçada de desapego.
Sinto o prazer do desprezo 
Sinto a fragilidade jogada pra escanteio.
Eu sinto muito. 
Sinto falta do primeiro encontro,
da surpresa,
das cambalhotas no mar,
dos beijos salgados
e das ondas fluidas.
Sinto o que se foi. 
Eu sinto muito.

Ainda dói

Choro prantos passados 
visíveis ainda 
em cantos guardados. 
Choro uma dor antiga, 
teimosa, 
uma ferida engessada. 
Choro a máscara intoxicada. 
Choro a fortaleza 
que inflou a escuridão. 

Emburrei-me para não sentir. 
Fui para o lado mais agressivo da força. Falei minhas tripas, 
cuspi meu estômago. 
Explodi minha cabeça
 Dancei passos certeiros e esquizofrênicos, 
exorcizando o pulso latente 
que ainda insiste em doer.

Assim

Estou enlatada,
cheia de conservantes.
Embalada a vácuo,
vazia de naturalidade.
Sem as cores 
que me iluminavam,
fiquei opaca!
Restaram cinzas.
O brilho evaporou com o álcool,
o viço com a fumaça 
e eu fiquei assim.
Assim, assim.
Com o amor que passou
e a rejeição que ficou.
Com as máscaras encobrindo a solidão
e as farsas impedindo o desejo.